quinta-feira, junho 19, 2003

O chôro pode vir do nada. É estranho.
Eu estava indo em direção ao meu carro, em companhia de alguns colegas até certo ponto. Meu carro estava do outro lado da rua. Atravessei, então, só. Me veio à cabeça e comecei a cantarolar "é tão estranho/ os bons morrem jovens/ assim parece ser/ quando me lembro de você/ que acabou indo embora/ cedo demais". Cantarolava em voz alta, só eu escutava. As lágrimas me vieram. Entrei no carro e continuava a repetir só essa parte da música. O carro me lembra ela. Tem a sombrinha dela, o adesivo que ela colocou, o saquinho de lixo que ela colocou, o carro é dela. Eu não agüentei, saí dirigindo e chorando. Embaçava as vistas e eu continuava dirigindo.
Falei várias coisas dela hoje no café da manhã, na casa de Vic. Engoli o chôro. Bebia água pra engolir o chôro. Cheguei em casa, no banho, não resisti mais. Chorei. Choro e peço a Deus que ela volte. Pergunto a Deus se ainda poderei abraçá-la um dia, se ela lembrará de mim, se eu ainda serei sua filha, se ela me protegerá como sempre fez. É impossível que ela tenha ido embora.
Estou em casa com minha avó e meu irmão. Meu pai viajou para Valença. A última viagem que fiz com meus pais foi para Valença, há pouco tempo. Ela estava linda. De azul. Era uma Bodas de Ouro. Ela sempre sonhou com as Bodas de Ouro dela. Ela chegaria lá, não fosse a doença. Choro até agora. Me faço todas as perguntas de novo. Pergunto em voz alta. Será que Deus pode me ouvir? Será que um dia Ele responderá? Será que vai demorar para eu reencontrá-la? Eu só quero o direito de ver a minha mãe. Para algumas pessoas isso é tão simples, é só olhar pro lado. Eu só vejo a minha mãe em fotos, em fitas, em imagens gravadas na memória. Eu lembro exatamente como era abraçá-la, apertá-la. Eu lembro de cada parte do corpo dela. A barriga, as pernas, as costas, os braços. Lembro de cada marquinha, lembro dos sinais, lembro de tudo. Dói saber que aquele corpo simplesmente não existe mais. Dói saber quie minha mãe não está no quarto ao lado, como Rafael sempre me diz, quando eu estava chorando com medo de perdê-la.
Choro e sei que sempre chorarei. Dói saber que meus meomentos de felicidade não serão mais completos. Ela não estará aqui para sorrir, me parabenizar, me fazer uma festa, me retribuir por todo meu sacrifício, como ela sempre fazia. Minha formatura, eu não terei o mesmo direito que meu irmão. Direito de vê-la subindo para me dar o diploma em mãos, sempre chorando. Ela sempre chorava nesses momentos. Eu chegava a apostar com ela que ela ia chorar e ela sempre perdia a aposta. Meu casamento, ela era sempre a mais bonita, a mais arrumada nos casamentos, mas ela nunca foi a mãe da noiva. Ela não terá o prazer de me ver chegar ao altar, coisa que ela sempre sonhou em ver. Ela não verá meus filhos. Ela não verá meu futuro. E isso me dói, me dói muito. Todo mundo precisa de uma mãe! Todo mundo precisa ter alguém que passa segurança, amor total. Minha mãe amava, minha mãe sempre amou. Minha mãe será para sempre amada. E eu guardarei para mim o sonho de vê-la velhinha. Tenho inveja de quem pode ver sua mãe envelhecer. Eu só queria poder ver a minha mãe fazer 51, 60, 73, 86, 90...até o dia que aguentasse. Eu queria, não posso.

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